Reflexão Crítica sobre a Ação Pedagógica do ensino Espírita no Brasil
Atualmente, percebemos uma grande falta de adaptação metodológica do ensino espírita em relação às práticas pedagógicas modernas. Apesar de entender que o centro espírita em si não é considerado um espaço privilegiado de ensino-aprendizagem, acredito que adaptações possam e devam ser feitas para atender aos diversos tipos de "alunos" que se interessam pela Ciência Espírita. Isso é importante porque, ao estudarmos os livros que embasam a doutrina, percebemos a complexidade da comunicação utilizada, que frequentemente exige uma pessoa central detentora de todo o conhecimento, enquanto os alunos ficam à mercê da boa vontade do professor para aprender.
Faço um convite aos leitores para conhecerem um conceito estudado na pedagogia chamado de relação Saber X Poder. Esse conceito pode ser entendido pela história do encontro entre Édipo e a Esfinge, onde podemos perceber que toda a identidade da Esfinge e sua condição de existência estavam centradas no fato de apenas ela possuir o saber, o que lhe garantia determinado poder. Embora esse conceito seja geralmente aplicado a ambientes escolares, acredito que os centros espíritas devam agir pedagogicamente, abordando o ensino da Doutrina de maneira semelhante às aulas de ciências exatas e humanas ministradas nas instituições de ensino do nosso país.
Há quem diga que o espiritismo é só para os ricos, e que assim ele deveria se manter para preservar seu status inabalável, permitindo que apenas grandes mentes do país consigam entendê-lo, aplicá-lo e ensiná-lo. No entanto, considerando a atual situação do país, essa exclusão não parece muito cristã, especialmente quando esses conceitos, se trabalhados, poderiam libertar um grande número de mentes. Para contextualizar, exemplifico com as reuniões atuais, onde muitos dos assuntos são ensinados exclusivamente pela boa vontade do palestrante em organizar e oferecer os ensinamentos conforme sua própria vontade.
Refletindo sobre a relação Saber X Poder, podemos recorrer à fala de Michel Foucault em seu livro "Microfísica do Poder", onde ele discute que o poder não reside nos polos onde é exercido, mas nas relações sociais, que são marcadas por disputas constantes e que modificam o cotidiano. Tendo isso em mente, deveríamos caminhar no sentido oposto de alimentar essas disputas de poder dentro dos centros espíritas. E como poderíamos fazer isso? Simplificando os conhecimentos. E, quando digo simplificar, refiro-me a uma abordagem democrática, onde os conhecimentos sobre a doutrina sejam acessíveis para quem não esteja em um centro específico, mantendo as portas abertas para novos alunos que compreendam os preceitos dos ensinamentos simplificados e desejem aprofundar seus conhecimentos sobre a Ciência Espírita. Deveríamos abolir o cabo de guerra entre o detentor do conhecimento e os "alunos". Pela teoria de Saber X Poder, sabemos que o enfrentamento constante entre alunos e professores ocorre devido à disputa pela autoridade e pela importância dos saberes presentes no currículo. Adaptando isso para a vivência do centro, acredito que a discussão se dará mais em torno da velocidade com que esses ensinamentos são passados.
O estudo da Ciência Espírita não pode ser tão diferente do estudo da matemática ou da biologia. Devemos oferecer um cronograma de estudos para os alunos que desejam estudar independentemente, fornecer mentorias e criar formas de avaliar o conhecimento desses alunos com base em cronogramas predefinidos pelo próprio centro. Não deixemos que os métodos de ensino arcaicos do nosso país se infiltrem nos centros e afastem as pessoas que mais precisam dos conhecimentos que oferecemos. Como professor, luto por um ensino voltado ao aluno, não aos caprichos do professor. Neste caso, o esclarecedor ou dialogador de uma reunião espírita deve entender-se como um agente educador, ciente da necessidade de procedimentos, escolhas, preparo e posturas para que o conhecimento seja transmitido. Precisamos traçar metas para identificar as necessidades dos aprendizes, planejar um cronograma que possibilite que todos aprendam, mesmo que assincronamente, e, se necessário, simplificar os conhecimentos propostos, adaptando o ensino espírita à realidade do nosso país. Aqui, eu expresso meu cuidado ao usar a palavra adaptar, dado que a ideia não é modificar nada, e sim SIMPLIFICAR o conhecimento para o entendimento do leigo. Essa foi a minha motivação para resumir o trabalho do livro dos médiuns de Allan Kardec.
Acredito que, se quisermos uma nova terra, as primeiras pessoas a mudar devem ser nós mesmos. Não acho que algo mágico acontecerá e, de repente, todos os nossos problemas desaparecerão. O centro espírita deve agir como uma escola, pois ensina uma ciência como qualquer outra, e a postura de quem ensina ciência deve ser a de um docente, um educador. Assim, quem sabe no futuro, as escolas não se inspirem em nossos resultados em libertar mentes e formar cidadãos espiritualizados e prontos para a evolução, adotando as mesmas práticas que nós, dos centros espíritas.
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